segunda-feira, 30 de julho de 2012

No português de Moçambique


Aqui em Moçambique, fala-se português na maioria das vezes, mas isso não é garantia de comunicação fluida. O português é bem lusitano, com palavras conhecidas nas nossas piadas, como bicha e rapariga, mas com uma pitadinha da pimenta africana.

Há uma porção de dialetos, quase 30 só em Moçambique. Quando a galera vê que tem um branco por perto e não quer que ele participe da conversa, tasca dialeto. Mas tem muita palavra que não existe e eles recorrem ao português. Dia desses estava no chapa e o motora falando com o cobrador “birulirularoler miripirotimoleno ENGARRAFAMENTO!”. Pelo menos entendi que não era de mim que estavam falando.

Também tem a famosa expressão “então tá NICE!”, que já recorre ao inglês e fica mais chique. Mas engraçado mesmo é quando eles falam “estamos juntos”. Pra eles, “estamos juntos” é como um “então beleza”. “Mano, vou ali almoçar e depois vou dar uma cochilada.” “Estamos juntos.”

Além disso, mulher deconhecida é "mama", ou "mami", pros mais meigos. Nada da tia da escola. É a mama mesmo. Acompanhando o raciocínio, nosso “tiozão” ou “tiozinho” é o “papa” deles, ou o “papi”. E quando a pessoa é brother, chama de mano. Tudo em família.

Eu, como boa brasileira que sou, já dei minhas mancadas por aqui. Dia desses fui a uma pastelaria. Estava lá, no letreiro, bem grandão: Twigo Pastelaria, Padaria e Restaurante. Pois bem. Chamo a garçonete.

- Tem pastel de quê?
- Não temos pasteis.
- Mas aqui não é uma pastelaria?
- É, sim senhora.
- E não tem pastel?

Respondeu nada. Ficou muda, me olhando com uma cara de que nada seria mais óbvio que não ter pastel numa pastelaria. Não entendi. Olhei o cardápio. Imaginei que Sandes era sanduiche, e era mesmo, mas a foto não era muito bonita. Depois descobri que, a não ser no KFC, a foto do cardápio nunca corresponde ao que é servido. E não é nada de propaganda enganosa, é que não tem nada a ver mesmo. A figura não ilustra a escrita. Pode ser uma foto de buchada de bode pra ilustrar uma caldeirada de mariscos. E ninguém liga pra isso mesmo.

Enfim. Olhei o cardápio e pedi um prego no pão. Prego é o que eles chamam de bife. Um xis-boi, com bife, tomate e cebola no pão francês, que aqui não chama de francês, só de pão. Pão de leite é pão de leite, pão de mel nem existe, mas pão francês é só pão. E pão de queijo é uma lenda que contam existir lá no Cantinho do Brasil, mas nunca consegui ver. Aliás, se a brasileira dona de lá dependesse disso pra viver no Brasil, morreria de fome. Pior comida que já provei na vida.

Dia desses, perguntei pro logista da ONG o que é uma pastelaria. Ele disse, com a maior obviedade do mundo, que é onde se fazem lanches, ô pá. Então, pra um bom brasileiro, pastelaria aqui é nossa tradicional lanchonete.

Pra geladeira, eles falam geleira. Comem omolete, e não omelete. E a feijoada deles tem nada a ver com a nossa. Vai carne de boi, e nem precisa ser com feijão preto. Tem até versão com frutos do mar – herança dos portuga.

Se você vai pegar uma carona com alguém, diz que vai pegar uma boleia. E boleia também é o nome daquelas motinhos indianas, cruza de moto com fusca, que aqui funcionam como taxi, e, na língua local, chamam-se chopela. Mas essa boleia não é de graça. Quando alguma coisa é na faixa, eles falam que é "de borla". A vantagem de andar de chopela é que é uma aventura a parte, pra compensar a metade do preço cobrado pelos taxis. Tentei fazer um viodizinho dia desses andando em uma. Posto durante a semana.

O trem aqui se chama comboio, mas é uma coisa que nunca funciona e todo mundo reclama. Pior um pouco que em São Paulo.

E o busão daqui se chama chapa. Aliás, esses chapas, meu amigo, são capazes de colocar suas orações em dia. Podem ser micro onibus (chapa 100) ou aquelas vans mesmo, estilo transporte clandestino. Mas em todo o tempo que morei em Foz do Iguaçu e de todas as vezes que cruzei a Ponte da Amizade, nunca vi uma van que chegasse aos pés desses chapas.

Pra quem conhece Foz do Iguaçu, pensa em uma van daquelas que cruzam a ponte. Daquelas típicas mesmo, que a porta não fecha e que a mola do banco fura a calça. Agora pensa nessa van depois de um tiroteio na ponte, cheio de negão suando de nervoso dentro. Pois este é o visual e o aroma dos chapas.
Se no inverno o fudum já é dos bravos, fico imaginando o que será de mim no verão.

Pensei em comprar uma bicicleta pra dar minhas voltas por aqui. Até vi uma marca local nesse final de semana, a Mozambike. Mas me disseram que era preciso ter carteira pra pilotar uma bike daquelas. Vai saber que poder ela tem nas suas 5 marchas. Mas pra andar de moto de poucas cilindradas, também ouvi dizer que não precisa de carteira. Então, até o verão, compro uma motinho. Até lá, dou minhas voltas de chapa mesmo.

3 comentários:

  1. Ahahahahha eh muito bom ler esses post de pessoas estrangeiras em Mocambique! Epah, isto aqui eh assim pah..Ta se mal...

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  2. Mozambike! Adorei!!!
    COmo assim precisa de carta pra bike e nao pra motinho?

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    1. Ainda preciso conferir essa informação, mas foi o que me disseram. Estranho, né? Também não precisa de capacete pra moto.
      Minha colega de trabalho disse que as coisas mudaram e que não é mais assim. Mas tenho cá minhas dúvidas heheheh

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